Dois mil doentes à espera de um rim novo

13 de dezembro de 2010

Cerca de dois mil portugueses são obrigados a começar a fazer hemodiálise, todos os anos, porque os seus rins deixam de funcionar.

Dia sim, dia não, logo que acaba o trabalho, Jorge Fonseca, de 33 anos, encaminha-se para o centro de hemodiálise da Amadora e ali passa quatro horas seguidas ligado a um monitor.Os seus rins não funcionam e a sua função é substituida pela mistura de  água purificada com substâncias de um concentrado escolhido pelos médicos que lhe é administrada através do monitor.

Natural de Angola, Jorge Fonseca veio para Portugal há quatro anos para “endireitar a vida”. Arranjou trabalho na construção civil, no estuque. Mas adoeceu. O sangue na urina levou-o ao hospital. As análises revelaram insuficiência renal. Ficou “preso” à máquina. Mas não diz nada ao patrão com medo de perder o emprego. A família está toda em Angola, ele reparte uma casa com um amigo e não tem outra alternativa senão trabalhar.

Dia sim, dia não, depois do trabalho, às 17h00, vai passar mais quatro a fazer tratamento no centro da Amadora onde, “felizmente” pode comer.

Agora, “só queria um trabalho compatível com o tratamento” diz. Sobretudo, queria ser chamado para fazer um transplante. “Deus queira que apareça algo que seja compatível”, deseja.

A assistente social, Eduarda Reis, recebeu-o para tentar ajudar e ficou surpreendida quando ele lhe disse que “não tinha papéis”. Jorge Fonseca está só, ilegal e doente num país que não é o dele.

Eduarda Reis vai fazer “o possível” para o ajudar. É mais um dos casos  difíceis dos doentes que recorrem àquele centro da Amadora, um “concelho muito pobre, com muitos idosos e pessoas isoladas”.  Cada vez é “mais difícil” intervir, diz, referindo o aumento de casos de “pobreza envergonhada, de fome, de acções de despejo” e de “imigrantes ilegais, clandestinos” que “caem num país onde não conhecem ninguém”.

Todos os anos, em Portugal, cerca de duas mil pessoas começam a fazer hemodiálise porque os seus rins deixam de funcionar, revelam dados da Sociedade Portuguesa de Nefrologia.

Em linguagem médica, entram em insuficiência renal terminal. Para sobreviver, não têm outra alternativa senão fazer um tratamento que consiste na remoção de substâncias tóxicas do sangue, substituindo a função renal, o que pode ser feito por hemodiálise (método mais utilizado) ou por diálise peritoneal.

Há cerca de 16 mil insuficientes renais em Portugal incluindo aqueles que receberam um transplante renal. É assim um dos países do mundo onde este problema tem maior incidência: 232 casos por um milhão de habitantes.

Três vezes por semana, o doente é ligado a uma máquina durante um determinado período, para receber  tratamento. Dos doentes em diálise  só 20 a 30 por cento é que têm condições para receber um rim novo, já que muitos insuficientes renais, por terem situações patológicas adicionais, não podem ser candidatos a receber um transplante.

Actualmente há cerca duas mil pessoas na lista de espera para um transplante  em Portugal. Em média, o período de espera é de quatro anos.  No ano passado, 593 doentes receberam um rim novo. 

A importância de aceitar

Todos as tardes o médico nefrologista Domingos Machado assegura o funcionamento do centro que dirige, na Amadora, onde trabalham mais quatro especialistas, outros médicos de outras especialidades,  muitos enfermeiros e uma dietista. Ali são atendidas semanalmente cerca de 140 pessoas, a maioria das quais homens já idosos.

Criada há 21 anos, esta é uma das 112 unidades de hemodiálise existentes no país. A grande maioria é privada e pertence a duas multinacionais que têm o Estado português como principal cliente.

No seu gabinete, Domingos Machado ocupa-se, sobretudo, da gestão do centro e vai dando resposta aos problemas que surgem, intervindo nos casos mais graves que se verificam durante a diálise.

Fonte: http://www.publico.pt/Sociedade/dois-mil-doentes-a-espera-de-um-rim-novo_1470568

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