Museu da Hemodiálise

2 de fevereiro de 2010

São de várias nacionalidades, na maioria norte-americana. Os seus nomes são pouco comuns, estranhos até, mas simbolizam uma época em que, no auge das suas capacidades, trataram da saúde a centenas e centenas de portugueses. Drake Willock, Cobe, Bellco, Gambro e Frenesius foram grandes estrelas do seu tempo. Hoje, retiradas de cena, só os especialistas as reconhecem.


Cândido Ferreira, o anfitrião que as acolheu, olha-as embevecido, incapaz de dizer qual a sua preferida, a que mais lhe tocou. "É muito difícil pôr as coisas nesses termos, sabe", afirma, ao DN, realçando que prefere olhar para elas como "se estivesse a observar as relíquias automóveis dos anos 70 e 80".

Pelos seus mecanismos passou muito sangue português. Ligados a elas, insuficientes renais de todo o país puderam continuar a viver, fruto da diálise, isto é, da limpeza do sangue, que tais aparelhos produziam. Finda a sua época, e após serem substituídas por equipamentos mais modernos, o seu destino normal seria o ferro-velho ou um qualquer canto empoeirado de uma arrumação. Não foi. Como muitas pessoas, gozam de uma velhice com grande qualidade.

Limpas e garbosas, de pose digna e luminosa, lá estão elas, as gloriosas máquinas de diálise, expostas naquele que é o primeiro espaço museológico português dedicado à nefrologia. Cândido Ferreira, nefrologista que há mais de 20 anos trocou os hospitais pelo trabalho na sua própria clínica, em Leiria, é o autor e impulsionador da ideia.

O objectivo, esclarece, "é procurar trazer para aqui toda a memória da nefrologia portuguesa", ambição que começa agora a dar os primeiros passos na espaçosa sala situada junto à recepção da sua moderna clínica, onde, actualmente, 240 pessoas fazem diálise, sem contar com as consultas.

Vários expositores em vidro mostram pequenos aparelhos, bibliografia e documentação variada sobre a especialidade, embora as jóias daquele memorial sejam indiscutivelmente as máquinas de diálise. "Digamos, em termos simplistas que não há grandes modificações, embora tudo seja diferente, quando as comparamos com as actuais máquinas, capazes de fazer uma diálise personalizada e absolutamente rigorosa", acrescenta o médico, que faz questão de sublinhar o protocolo realizado com a Sociedade Portuguesa de Nefrologia, com vista a dar uma amplitude nacional e de maior envergadura ao "seu" museu.

No fundo, "aquilo que estamos a fazer é arqueologia ligada à medicina", acrescenta Cândido Ferreira, cuja atenção neste momento está virada para "as muitas máquinas que estão a apodrecer nos hospitais portugueses". Daí que, em breve, vá iniciar contactos, no sentido de tentar adquirir esses equipamentos, porquanto está convicto de que "ainda existem aparelhos da década de 60 que seria muito interessante recuperar" para o museu.

"Somos o País que despreza estas coisas e que deita tudo fora", lamenta o médico, para quem "este luxo do abandono e do esquecimento é um erro que um dia haveremos de chorar".

Fonte: http://dn.sapo.pt/inicio/interior.aspx?content_id=636719

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